Um (pequeno) «enorme» transporte digital com tudo o que pode desejar.
Dito tudo isto, importa ainda referir alguns aspectos práticos relevantes - no teste destes produtos acho sempre bastante relevante falar muito do uso no dia-a-dia, embora também me debruce sobre o som um pouco mais à frente. Uma primeira peculiaridade da Auralic é que a (excelente) aplicação só existe para iOs - se só tiver Android, é preciso contar com a compra de um iPad para tomar total partido do ARIES S1, sendo que hoje em dia estes produtos já são (felizmente) bastante mais acessíveis. Não deixa de ser, no entanto, algo peculiar e seria certamente bem-vinda a adição de uma aplicação (de igual qualidade) ao universo Android - sendo possível, no entanto, usar o Aries S1 com uma combinação de browser de Internet, a aplicação da Linn (Windows e Android) ou o Bubble UPnP (Android), e os botões e menus físicos presentes na unidade. Mas com um iPad, a coisa fica muito mais simples, e é fortemente recomendado que tenha um.
E, numa ode à ironia, a Auralic desenvolveu recentemente o protocolo Lightning Cast que só funciona em… tablets Android (e só os Google Pixel ou uma unidade vendida pela própria Auralic) - o que significa que, para tirar total partido do Aries S1, se aconselha um iPad e um Pixel Tablet (ou o Auralic tablet). Não tendo um Pixel Tablet comigo, posso explicar rapidamente o que é o Lightning Cast e que problemas vem resolver. É minha opinião, já há bastante tempo, que o futuro dos streamers de alta-fidelidade passará acima de tudo por protocolos externos - por muito boas que algumas aplicações de alta-fidelidade sejam (como esta Lightning DS), muitas ainda alternam entre o bom e o medíocre, e a experiência da aplicações nativas de serviços externos está cada vez melhor e nota-se cada vez mais a diferença para as aplicações dos streamers. Como exemplo, uso regularmente um Cambridge Audio MXN10 e passo meses sem abrir a aplicação, usando apenas protocolos externos.
Mas existem vários problemas com os protocolos externos - o UPNP não está estandardizado, o OpenHome não tem cobertura suficiente, o Chromecast Audio também não (para além de que não é gapless e está limitado a 24 bits-96 kHz) e o AirPlay 2 está limitado a qualidade de CD e parece não ser sempre lossless, tendo estando recentemente envolvido em bastantes polémicas. Alguns serviços de streaming têm excelentes protocolos Connect, como o Spotify ou o Tidal (e o Qobuz, em fase Beta), mas os que não têm não se sabe se alguma vez terão… E entra o Lightning Cast, que funciona num Tablet Android optimizado para tal, e que garante que o som sai bit perfect, sem a reamostragem do sistema Android, e que necessita de um streamer também ele equipado com Lightning Cast (os modelos G e S da Auralic estão já prontos, sendo que o código é aberto e mais marcas poderão adoptar este modelo em breve). Com resolução até 32 bits-192 kHz, supondo que seja gapless, este protocolo promete muito e é particularmente útil para quem queira usar a aplicação nativa de serviços como a Apple Music ou a Amazon Music, que não possuem protocolo Connect:
Munidos então de um iPad, o setup inicial é muito simples, com a tradicional ligação à rede, umas quantos menus e tudo está pronto a ir. Testei o Aries S1 maioritariamente com Qobuz e com ficheiros num servidor NAS, e ainda com um TEAC UD-507 (ou um iFi Pro iDSD) e um TEAC AP-505, e umas KEF LS50 (verão original). Seguem algumas notas em baixo:
1) A aplicação é excelente, de longe a melhor que já testei (embora ainda me faltem algumas). O manuseamento da biblioteca, quer por ficheiros, quer por Qobuz é simples e bonita e, o mais importante, o menu now playing é excelente - em modo portrait com uma capa grande a ocupar todo o ecrã e em modo landscape, o meu preferido, com uma capa grande lado esquerdo e a queue do lado direito, com a música que está a tocar seleccionada e com a duração de cada faixa claramente visível, relembrando a experiência de ouvir um CD com a parte de trás da caixa junto a nós. Gostaria apenas que dois pormenores fossem melhorados: que o browse por artistas incluísse fotografias grandes, e passíveis de edição, como acontece no browse por álbuns; e que uma opção repeat one fosse adicionada, permitindo ouvir a mesma faixa em repetição - mas foi-me indicado pela Auralic que nenhuma destas opções será possível, sendo naturalmente possível, no segundo “problema”, fazer a batota de construir uma lista de reprodução só com uma faixa e accionar repeat all, que neste caso significa repeat one.
Para quem, apesar de ter um iPad, não goste de usar produtos Apple ou para quem, por exemplo, tenha um iPhone com o qual faça a parametrização inicial e depois queira utilizar um ecrã maior mas não queira um comprar mais um gadget, as aplicações Bubble UPnP (para Android, com o MinimServer ou o Lightning Server) e Linn (para Android ou Windows, com o MinimServer ou o Lighning Server) funcionam muito bem com o Aries S1, e permitem inclusive um excelente browse de artistas quando combinadas com o MinimServer, mitigando assim uma das poucas falhas da Lightning Ds - com a aplicação da Linn é até possível alterar a entrada do Aries S1. Para além destas possibilidades, existe também uma página de Internet onde podemos aceder aos quatros menus de definições (library setup, streamer setup, processor setup e hardware setup) de forma rápida e simples, em qualquer dispositivo com browser - em teoria também é possível regular tudo isto no próprio dispositivo, devidamente munido de uma lupa e alguma paciência, mas é experiência que não aconselho.
2) O uso interno do Qobuz é também muito bom, mas o protocolo Connect ainda não está funcional, apesar de aparecer como uma das entradas na aplicação (foi-me explicado pela Auralic que, desta forma, quando o Qobuz Connect estiver pronto, bastará lançar um firmware novo e não será preciso actualizar a aplicação). Uma pequena dica: geralmente os discos novos saem à sexta-feira e, mesmo não estando disponíveis no menu new releases, se fizer uma busca eles aparecem (fiz o teste no dia 28 de Fevereiro e todos os discos que saíram nesse dia e que quis ouvir já estavam disponíveis). O ideal seria que este menu fosse actualizado, e daí o meu comentário em cima de que o futuro passará muito mais pelo uso das aplicações de streaming (ou de ficheiros) do que das próprias aplicações. Fiquei também um pouco confuso ao princípio sobre como desligar a opção auto-play do Qobuz, opção que sei que encanta muitos mas que me deixa deveras irritado - nunca gostei de rádio e a música, para mim, ouve-se com um disco do princípio ao fim… O Google ajudou-me e essa opção está no menu Streamer Setup, vindo sempre ligada por opção. Outra pequena peculiaridade foi não conseguir ouvir Qobuz com protocolos externos, quer pelo Bubble UPnP (Android), quer pela Linn Kazoo (Windows), sendo obrigando mesmo a ter de reiniciar a máquina.
3) Testei brevemente o Roon Ready e o Spotify Connect e funcionam também sem falhas, como aliás sempre acontece com estes protocolos. Assumo que o mesmo se passe com o Tidal Connect.
O Aries S1 com a fonte de alimentação externa (opcional)
4) A integração do Auralic com servidores de ficheiros externos é algo peculiar e seguem aqui algumas dicas para actuais ou futuros utilizadores - se bem que me pareça que a esmagadora maioria das pessoas, feliz ou infelizmente, já se dedicou quase em exclusivo ao streaming. Ao contrário do que a Auralic indica no seu website, os seus produtos, na sua configuração actual, não são compatíveis com UPNP/DLNA, funcionando numa espécie de híbrido customizado entre o UPNP e o OpenHome (um tipo de UPNP 2.0 desenvolvido pela Linn, onde a lista de reprodução é controlada pelo streamer e não aplicação de controlo). Demorei algum tempo a perceber tudo isto, não só porque no website a Auralic indica ser compatível com UPnP/DLNA, mas também porque na aplicação Bubble UPNP, que distingue sempre entre UPnP e OpenHome, o Aries S1 aparece como UPNP - embora quando se faz play a um disco, toda a lista de reprodução apareça imediatamente no Aries S1, o que indicaria claramente OpenHome. Para confundir ainda mais, usando quer no Symfonium quer no Emby, o Aries S1 aparece como UPNP, embora só toque uma música - problema que se repete também com o Audirvana para Windows, que também só funciona com UPNP. O Audirvana, aliás, só aumentou a minha confusão, porque a Auralic aparece como certificada pela marca como Plays with Audirvana - o que é verdade, mas por… USB (a necessidade desta certificação, como a de Roon Tested, é algo que me ultrapassa e que creio que só introduz potenciais clientes em erro). E, para aumentar ainda mais a confusão, alguns produtos mais antigos da Auralic eram mesmo compatíveis com UPnP, tendo uma opção «Work Mode» para alternar entre a Lightning DS (híbrido UPnP/Open Home) e UPnP “puro”, mas essa opção já não está disponível nos modelos actuais. Mesmo com o Foobar, que tem um protocolo UPnP em continuous stream, o Auralic não funciona perfeitamente… Aliás a incompatibilidade entre UPNP e OpenHome é comum, e a única marca que experimentei até hoje que executa ambos perfeitamente é a Lumin (na forma de um Audiolab 9000N, que usa o software de streaming da Lumin), ver o link abaixo:
É também possível «construir» um Lightning Server, apontando a Lightning DS (aplicação da Auralic) para uma pasta, por exemplo, num NAS. Usando a Lightning DS, o uso do Lightning Server tem algumas vantagens, dando mais informação sobre os ficheiros mas, como já tenho o MinimServer montado, e este é compatível com OpenHome, acabei por achar mais simples usar o MinimServer. De qualquer forma é perfeitamente possível «construir» as duas bibliotecas e mudar entre elas sempre que quiser - o processo de troca entre ambas é muito rápido e simples. Deixo aqui uma pequena nota final: não me foi muito simples apontar o Lightning Server ao endereço certo do meu NAS, e finalmente percebi que a fórmula é a seguinte: IP do NAS mais «folder path», como está abaixo:
IPNAS/Miguel/Backup Miguel/PC/Creme de la Creme (MinimServer)
Passados estes testes iniciais, como disse em cima, a integração com o MinimServer e o Bubble UPNP é soberba e recomendo a todos os que tenham produtos Auralic que a experimentem - usando o Bubble UPNP para fazer browse da biblioteca (aqui com fotos de artistas) e enviando a música para o Aries S1, este integra imediatamente toda a lista de reprodução e é possível acompanhar nas duas aplicações (Bubble UPNP em tablet Android no modo portrait e Lighting DS em iPad landscape) em tempo real a reprodução de um disco. O MinimServer tem sido aliás o servidor que me tem dado a melhor experiência em geral, sempre muito rápido e fiável, vale bem os 35 € de investimento inicial e os 12 € de renovação anual pela versão premium.